sexta-feira, novembro 24, 2006

Noite de natal

- Olá, será que você poderia me passar o purê de batatas?
- Purê? Onde você está vendo purê de batatas em cima da mesa?
- Logo ali, perto do tutu de feijão.
- Tutu? Poxa vida, parece que a sua ceia vai ser melhor do que a minha, porque eu não estou enxergando nem tutu e muito menos purê em cima da mesa!
- Está logo ali, dentro daquelas tigelas redondas.
- Aquelas? Com quatro pontas cada?
- Não As de quatro pontas são quadradas ou então retangulares.
- E o que são tigelas redondas?
- Você já abriu maionese, refrigerante?
- Não! Eu tenho problemas de anemia, veja o meu físico, eu não consigo fazer muito esforço, eu não consegui abrir nenhum tipo de condimento.
- Chama este cara aí do seu lado por favor.
Um terceiro entra na conversa:
- Ei, aquele cara ali tá te chamando (disse isso apontando o dedo indica-acusador para o moço que queria purê e tutu).
- Sim!
- Amigo, será que você poderia me passar o purê?
- Claro!
Pegou uma vasilha com molho de pimenta e passou para o rapaz.
- Amigo, isso não é purê...
- É sim... isso daí é dendê, pode provar, tá arretado.
- Porra, isso era para ser uma ceia de natal, quem é que coloca dendê na mesa? Eu não quero dendê eu quero é purê, aquela coisa feita com batatas que é batida junto com leite ou água.
Cansado de tentar se fazer entender por um burro e outro surdo, levantou-se da cabeceira da mesa e foi até as tigelas redondas, trouxe uma em cada braço.
O burro:
- Ahhh isso é que são tigelas redondas? Ahhh, porque você não disse que era a tigela que era parecida com uma roda? Eu te passaria, qual das duas tigelas tem purê?
- Essa daqui ohhh, a que é mais clarinha... A mais escura é tutu de feijão.
- Ahhh, bacana, aprendi isso hoje... E isso daí é bom?
- É sim, você nunca comeu isso não?
- Não...
- Pega aí, põe no prato, experimenta...
- Quero não moço, tô aqui só pra comer a galinha...
- Galinha, que galinha?
- Poxa, moço, aquela que tá ali em cima da mesa...
- Aquilo não é galinha, é Chester...
- Poxa, mas tu é burro hein moço, sabe nem o que é galinha... Aquela ali foi minha mulher mesmo quem preparou, peguei a galinha num despacho que tava na esquila lá de casa, e como eu não sou supersticioso, pedi minha patroa pra preparar o troço pra nóis, e sabe como é, natal, nascimento de Cristo, acho que nada de mal pode acontecer a ninguém hoje.
- Eu não sou burro amigo, burro é você que não sabe o que é purê e tutu, e muito menos sabe o que é redondo ou quadrado. E eu não como esta galinha nem por decreto. Minha mulher preparou um Chester, e é ele que eu vou comer...
- O que é decre... decre... decre o que mesmo?
- Decreto.
- É isso mesmo, o que é isso aí que você disse?
- Eu não tô afim de ficar explicando as coisas para uma pessoa que acabou de dizer que eu sou burro.
Colocou o purê e o tutu no prato. O Silêncio durou algum tempo.
- Moço?
- O que é?
- Aquele troço que tu falou... Jester... É bom?
- É sim, o gosto é igual ao do frango.
- Ahhhh... E por que se chama assim? Jester?
- É Chester... Não sei, porque alguém quis chamá-lo assim...
- E esse Jester voa moço? Porque eu sei que galinha não voa.
- Eu não sei, eu nunca vi um Chester, mas acredito que não, ele é bem parecido com um frango.
- Se o senhor nunca viu um Jester como é que você sabe que ele existe? Como é que o senhor sabe que não é uma galinha que o pessoal pegou no despacho, empacotou e escreveu o nome Jester só pro pessoal achar que era Jester?
- Eu não sei te responder isso.
Neste momento entra uma senhora gorda perguntando onde estava o mexido de miúdos batidos e o guisado de mandioca sêmem de boi.
- Ohhh benzinho, acho que esse moço aqui já colocou tudo no prato dele... Ele disse que isso se chama purê e tutu... Parece que ele gosta muito disso.
Ânsia... Ânsia... Ânsia... ÂNSIA...
VÔOOOOOOOMIIIIIITTTTOOOOO.
- Aposto que tu vomitou tudo só pra sobrar mais espaço pro Jester, o senhor é esperto...
- Tá vendo aquela moça ali?
- Tô sim, aquela senhora bonita e gostosa de olhos claros? Vou te contar uma coisa, mas não espalha pra ninguém não, eu trepei com ela ainda hoje no banheiro da empregada.
- Caralho, aquela é a minha mulher...
- É... Eu não sabia, mas a sua mulher é boa hein rapaz... Você quer mesmo que eu chame ela?
- Não, deixa pra lá...
Pegou o Chester e jogou bem no meio da testa de sua futura ex-mulher...
- Cara, que máximo... Jester voa...